Lembro-me do livro de capa dura do Círculo de Leitores que celebrava em apoteose os “descobrimentos” portugueses. Lembro-me de o folhear com solenidade, com mãos papudas e olhos sôfregos. Lembro-me de enumerar a ordem pela qual ia visitar e fotografar todos aqueles sítios. Primeiro a índia. Timor Leste ficava para o fim por estar mais fora de mão.
Lembro-me das longas viagens de França para Portugal e de ainda ficarem mais longas de Portugal para França. Lembro-me do calor abrasador no carro sem ar condicionado e de que Espanha era um imenso campo de trigo dourado e pequenos montes com touros de metal. Lembro-me de soletrar todas as letras da placa a anunciar Portugal, em Vilar Formoso, como quem reza uma Ave Maria. Em adoração.
Lembro-me de que nas viagens havia sempre pão com Nutella à ida e tulicreme no regresso, e que o meu pai, para afugentar o sono, escolhia um carro ao qual se “colava” que nem uma lapa até chegar a casa.
Lembro-me agora, que lembrar, lembrar mesmo, não me lembro de muito. Mas lembro-me como se fosse hoje que os dias em viagem e em família eram os melhores de todos os meus dias.
Há quem entenda que só se deve levar os filhos em viagem quando já têm idade para se lembrar. Que não faz sentido investir em bilhetes de avião, quartos de hotel e energia quando a criança não guardará na memória o que um dia foi presente.
Já eu acho que damos demasiada importância ao futuro, que é o “sítio” onde vivem as memórias, e que, para mim, só há um tempo que vale mesmo a pena conjugar: o presente.
Quando este dia era presente, o Magno perguntava-me o que eram aqueles pedaços de gelo e se os podia lamber.
Aqui, neste “agora”, assistia ao melhor “National Geographic” em 3D e tentava imitar o som dos animais que via acompanhado de bolachas Maria.
Neste “presente” corria feliz debaixo do sol quente da índia.
Aqui, entrava vestido a rigor num templo budista milenar, com o Tenzin, com que nos recebeu no Butão.
E neste aqui sorria despenteado pelo vento morno do deserto da Namíbia.
Aqui brincava aos pilotos na Islândia e aprendia o que queria dizer “mayday”.
E neste “presente” fazia as delícias dos monges tailandeses.
Neste, tentava meter abelhas em bolas de sabão com cheirinho a alfazema.
O Magno pode até nem se lembrar da maior parte destes pretéritos mais que perfeitos, mas enquanto foram presente, juro-vos, a felicidade morava ali.
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2 Responses
Belo texto!!Parabéns aos 3!! Lindas fotos! Ainda tenho vagamente alguns flaches de lembranças com 3/4/5 anos!! O Magno vai ver estas fotos quando for grande e mesmo que não se lembre de tudo há-de certamente fazer as histórias das suas viagens na cabeça dele!! Beijinhos
Muito obrigada e um grande beijinho <3